sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Deusa

Tempo parado nas imagens, na cinza negra esbranquiçada da memória. Uma voz divina cantava-me ao ouvido um longo recado celestial. Deus era uma voz de mulher, deus era uma voz feminina, deusa que me dizia aos ouvidos "Eu sou uma fruta gogóia / eu sou uma moça / eu sou calunga de louça / eu sou uma jóia...". Eu estremecia por dentro, chorava um choro sem lágrimas, que muitas vezes é o choro que mais custa. Era tão feliz assim, no tempo que não tinha tempo, para além de ser infinito. E a voz voltava, uma e outra, e outra vez ainda, sussurrando-me "Quando você me ouvir chorar / Tente, não cante, não conte comigo", e eu contava, como sempre contei.

* imagem de Gal Costa, e excertos das canções Fruta Gogóia e Como dois e dois, do disco Fa-tal, Gal a Todo Vapor (1971)

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