domingo, 30 de junho de 2013

Krautrock - um possível Top 10



Nota prévia: começo por dizer que este post tem apenas o propósito de tornar público um género musical muito pouco conhecido da generalidade dos ouvintes assíduos de música. Mesmo sabendo que os mais aficionados melómanos conhecerão o termo e o estilo musical, e até mesmo algumas das obras históricas e incontornáveis desse movimento, este artigo é exclusivamente revelador da minha opinião, resultado de um conhecimento já longo e experimentado (enquanto ouvinte atento, obviamente), bem como de leituras várias feitas sobre o assunto. Terá um breve enquadramento histórico, e depois seguir-se-á um Top 10 dos discos que, para o meu gosto pessoal, me parecem ser essenciais. Decidi, para que o leitor possa ter um conhecimento um pouco mais alargado, que escolherei apenas um trabalho de cada banda escolhida. Espero, sobretudo, que este texto funcione como uma espécie de beginners guide para essa maravilhosa música cósmica, que é comumente desginada por Krautrock.

O Krautrock surge na antiga República Federal Alemã, na transição dos anos 60/70 do século passado. É, sobretudo, uma reação muito genuína e contrária à música que se fazia e ouvia no ocidente. Depois da segunda guerra mundial foi-se sentindo um vazio cultural e musical em toda a Alemanha, e aos poucos, começaram a aparecer sinais de vida sonora, diferentes em tudo do que se fazia, e até ridicularizados por uma boa parte da imprensa inglesa, por exemplo. Na verdade, e naqueles dias, o termo Krautrock tinha um significado bastante negativo ("repolho azedo")e designava, por não haver melhor expressão, uma música que misturava elementos psicadélicos, música erudita de vanguarda, minimalismo, free jazz e, por vezes, um fortíssimo sentido ambiental, bem como um elevado grau de experimentalismo atonal. Aquilo que era tipo como algo sem futuro e sem condições de sobrevivência tornou-se, com a passagem do tempo, um fenómeno de culto, e base fundamental para o surgimento de bandas como Joy Division, PIL, Sonic Youth, Stereolab e Radiohead, entra tantas e tantas outras.
Foi há pouco mais de 10 anos que entrei no mundo do Krautrock. O meu gosto pela obra do músico Julian Cope, e o facto de ter lido na sua autobiografia Head On / Repossessed, que o antigo mentor dos The Teradrop Explodes sempre foi um apaixonado do género, levou-me a querer saber mais e a ouvir o que era, na verdade, essa Kosmische Musik por ele tão idolatrada. Foi uma ótima decisão, uma vez que essa aproximação a uma nova realidade sonora só me trouxe muitas e muito boas razões de contentamento. Daí que, no sentido óbvio de partilha que este site tem, resolvi trazer para estas linhas um Top 10 de Krautrock. A ordem pela qual os discos serão apresentados é alfabética, embora possa tornar-se clara a minha especial preferência nessa preferência já existente no conjunto dos 10 discos que escolhi e irei mencionar. Vamos lá a isso, então!

1. Ash Ra Tempel - Ash Ra Tempel (Ohr, 1971): O disco da tripla Hartmut Enke, Manuel Göttsching, e Klaus Schulze tem apenas duas longas faixas: "Amboss" e "Traummaschine" são enormes lençóis de som. Na primeira podemos ouvir, rendidos, a uma jam session de explosão e comedimento, e na segunda o contraste é notório, uma vez que a calma impera, num registo mais ambiental, onde tudo se vai desvanecendo até ao silêncio para onde se caminha, e que chega 25 minutos depois do início da faixa.

2. CAN - Tago Mago (United Artists, 1971): Tago Mago é considerado um dos melhores disco de Krautrock de sempre, e citado por muita gente do meio musical como uma obra prima intemporal. Este duplo álbum revela uma equipa coesa de músicos dedicados e empenhados em fazer algo de extraordinário. Ao terceiro disco, os CAN conseguem um disco de fine vibe do princípio até ao fim. Quem nunca ouviu "Mushroom", por exemplo, não sabe o que é estar far out sem ajuda de qualquer aditivo a não ser o som.

3. Cluster - Sowiesoso (Sky Records, 1976): Sowiesoso é o quarto disco da banda, e nele ouvimos eletrónica misturada com vagos elementos sonoros que nos levam até ao oriente, como acontece na belíssima "Halwa". É um disco misterioso, algo sombrio, surpreendendo de quando em vez por revelar alguns apontamentos luminosos e nostálgicos ao mesmo tempo. É de uma enorme beleza, e a canção "Es War Einmal" deveria fazer parte de uma qualquer banda sonora do paraíso. 

4. The Cosmic Jokers - The Cosmic Jokers (Kosmische Musik, 1974): Este é um disco de uma banda que nunca o foi , como qualquer wikipedia desta vida o poderá elucidar. O que aqui temos é mais um disco à maneira de Ash Ra Tempel, com duas longas faixas, sendo que a primeira é bem reveladora de uma boa trip ácida, e a segunda avança no sentido de nos trazer de novo a terra. Um excelente exemplo de música cósmica!

5. Harmonia - Musik von Harmonia (Brain Records, 1974): Hans-Joachim Roedelius, Michael Rother e Dieter Moebius formaram a banda Harmonia, e este é o seu primeiro trabalho. Nada é comparável a Musik von Harmonia, uma vez que aqui temos de tudo um pouco: escuridão, luminosidade, ritmos mecânicos e acústicos. No entanto, a ideia que fica é a de que resulta maravilhosamente bem. O mago Brian Eno considera-o um dos discos mais importantes de sempre, por exemplo.

6. Kraftwerk - Autobahn (Philips / Vertigo, 1974): Os krautrockers mais puristas teriam feito outra escolha, eventualmente. Qualquer um dos três primeiros discos (KraftwerkKraftwerk 2 ou Ralf und Florian) talvez servissem ainda melhor como exemplo dos primórdios do krautrock, mas Autobahn é superlativo, e a pedra de toque para o futuro da música eletrónica desta importantíssima banda alemã. Quem nunca ouviu esse elogio ao automóvel e às autoestradas que é a longa faixa título, tem de se apressar. É essencial!

7. La Düsseldorf - La Düsseldorf (Teldec Records, 1976): Após os Neu! terem posto fim ao projeto, Klaus Dinger, Thomas Dinger (irmão do primeiro) e Hans Lampe fazem nascer La Düsseldorf. Este é um disco absolutamente entusiamante, onde a inconfundível motorika se faz presente do princípio ao fim. Começa em festa e acaba em festa. Ritmo, bom gosto, melodias que ondeiam e que ocupam, a espaços, primeiro a cabeça, depois os membros, e por fim, a alma.

8. Neu! - Neu! 75 (Brain Records, 1975): Melódico e inconvencional, mostrando bem as direções divergentes que os seus membros queriam seguir. Foi o terceiro e penúltimo trabalho da banda (só em 2010 surge um quarto e derradeiro disco, gravado entre 85 e 86, que nada acrescenta ao glorioso percurso dos Neu!, antes pelo contrário). A minha escolha poderia (e deveria?) recair sobre qualquer um dos dois primeiros discos da banda, mas em Neu! 75 existe "Sea Land", e isso é já dizer tudo!

9. Popol Vuh - Einsjäger & Siebenjäger  (Kosmische Musik, 1974): A beleza personificada através do som! Encantamento absoluto! Como ficar indiferente ao piano de Florian Fricke e às guitarras de Daniel Fichelscher? E à divina voz de Djong Yun? Três impossibilidades... Todo o disco é hipnótico. As cinco faixas inicias, bastante curtas todas elas, preparam-nos para a imensa surpresa que é a faixa que dá nome ao disco, e que ocupa inteiramente o lado B.

10. Tangerine Dream - Alpha Centauri (Ohr, 1971): Este é o segundo álbum dos chamados Pink Years, e segundo álbum, de facto, da banda germânica. Três composições apenas, que vão crescendo e crescendo nos tempos que demoram. É um disco assustador, quase tétrico, embora ainda muito primário nas técnicas de gravação e som que utiliza. talvez resulte daí a sua maior magia. Adoro Alpha Centauri, e julgo não ser difícil alguém poder partilhar desta opinião. Mas, há que lembrar, é preciso tempo para saborear esta grandíssima viagem mental.

O post já vai longo, e por isso há que lhe pôr um fim. No entanto, fica a informação para quem possa mostrar interesse, e quiser saber mais sobre Krautrock: apesar de haver muitas leituras possíveis a fazer, a obra Krautrocksampler, de Julian Cope (Head Heritage, KAK Ltd, 1995) é fundamental. A versão inglesa original é quase impossível de encontrar, atingindo preços astronómicos sempre que se vêem à venda. Há traduções em francês, alemão e italiano, todas elas excelentes.

2 comentários:

fado alexandrino. disse...

Tenho o "Krautrock - Music for your Brain Vol. 3" seis CD's.
Peço desculpa, ainda não ouvi, mas agora fiquei curioso de ouvir.
Breve.

Carlos Lopes disse...

Eu conheço o título, mas não o tenho nem ouvi. Deve ter coisas interessantes, certamente.