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Depois de vários dias a ouvir
Zii e Zie, decido-me a escrever sobre ele. Já fiz, seguramente, mais de 10 audições integrais do último disco de
Caetano Veloso, e por isso atrevo-me a dizer agora o que penso... Começo por dizer que
Zii e Zie é um disco que chega aos ouvidos sem fazer alarde, devagar, com a subtileza das coisas sem pressa. É um disco tranquilo, sem a energia eléctrica mais ou menos contida de
Cê (o trabalho anterior). É um disco menos coeso em termos das letras das canções (ainda comparando-o com
Cê, que mostrava uma vertente mais carnal, sexual, despojadas de qualquer pudor, bastando para isso lembrar apenas o exemplo do verso tantas vezes repetido da canção
Porquê? - "
estou-me a vir"). As letras das canções de
Zii e Zie versam assuntos tão diferentes como sejam a política norte americana ou o Rio de Janeiro.
(Pedro Sá, Ricardo Gomes, Caetano Veloso e Marcello Calado)
Este é um disco muito carioca, muito centrado na ideia do samba, mas como com
Caetano as coisas nunca são assim tão simples, o samba que aqui se ouve tem um acentuado travo rock (
transambas e
transrock são subtítulos ajustadíssimos) e é isso que une o disco e faz dele uma obra bem equilibrada. Apenas a canção
Menina da Ria (de longe a canção menos conseguida, na minha opinião, e muito distante do belíssimo hino masculino que é
Menino do Rio, que merecia uma melhor canção como
companheira) foge um pouco ao
esquema samba-rock. É, não me custa dizê-lo, uma marchinha sem grande graça, apenas com uma
particularidade lusíada, quando se canta "
Ai, Portugal, ovos moles, Aveiro", mas que destoa no tom do todo das canções do disco.
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Os grandes momentos são
Lapa (magnífica, um futuro clássico),
Sem Cais (arrepiante),
Por Quem (sensível, imensa),
A Cor Amarela (que resultará muito bem ao vivo, certamente),
Tarado (uma das mais estranhas letras de
Zii e Zie) e a versão de
Incompatibilidade de Génios (deslumbrante versão do samba de
João Bosco e
Aldir Blanc). Os outros momentos (
Perdeu,
Lobão Tem Razão,
Base de Guantanamo,
Ingenuidade e
Diferentemente) são também canções maiores, não nos iludamos, mas um
semi-furo abaixo das mencionadas primeiramente.
Zii e Zie é um disco de um jovem de 66 anos, acompanhado por três jovens de 20 e poucos anos, mas que não é para todas as idades. Ou melhor: até poderá ser, desde que quem o ouça seja capaz de ser um ouvinte sensível, porque
Zii e Zie é um disco que transborda de sensibilidade. Não é um disco fácil? Claro que não. É mais um
disco para entendidos (como
Araçá Azul)? Talvez não. Julgo mesmo que não. Ou então sou eu que já
entendo Caetano há tanto tempo, que já não estranho a estranheza daquilo que faz: música apontada à perfeição.
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